quarta-feira, 14 de janeiro de 2009

Motivos para ler o seu horóscopo antes de cantar alguém

De forma graciosa, ela se inclinou com todo o cuidado para que seus cachos negros não se chamuscassem na chama do zippo com o qual aquele homem acendia seu cigarro.

“Você com essa cara de menininha fuma?”
“Qual o problema? Só mulheres que lembram personagens que a Sharon Stone interpretaria podem fumar?”

Ela sempre achou graça desse selo que todo mundo lhe impunha: bonequinha, não importa se de pano ou porcelana, a eterna bonequinha. Mas o sorriso que ela deixara escapar com esse pensamento não tiraria de todo a razão desse pessoal que gosta de estereotipar. E seus olhos de cor indefinida começaram a correr todo o rosto daquele desconhecido. Igual a crianças correndo pelo campo empinando papagaios, como quem brinca de deuses que pintam o céu com estrelas. Sabe o interessante dos olhos que não se pode identificar a cor? Eles possuem mudanças bruscas de humor de acordo com o tempo. Em dias de sol, eles ficam de um amendoado claro e transmitem uma calorosa sensação de paz. Mas era noite. De lua cheia.

O pobre homem já estava totalmente perdido. E ele só conseguia pensar: meu Deus, quantos anos ela tem?

“Meu Deus, quantos anos você tem?”
“Bem mais que o mínimo para te colocar na cadeia”

Sorrisos, risos, gargalhadas tímidas, gargalhadas estonteantes. Alegria bailando em sinfonia pelas mesas de um Belmonte curiosamente vazio. Você esperaria acontecimentos normais em uma quase madrugada de sábado onde fosse possível conseguir uma mesa rápido no Belmonte? Ele não poderia deixar passar a oportunidade, e teria que agir rapidamente, tendo em vista as duas caipirinhas coloridas que sua adorável companhia sorveu à moda dos irlandeses. Sendo assim, despencaram rua abaixo de uma madrugada carioca igualmente vazia. Assustadoramente vazia. Preencheram as ruas solitárias como um vendaval, daqueles capazes de destruir casas inteiras. Sabendo-se as únicas almas presentes se declararam donos dos degraus que foram escalados dois-a-dois, da porta que foi praticamente arrombada, de cada peça de roupa apressadamente despida e da cama onde repousariam horas depois.

Mas não puderam se declarar donos do tempo e dos curiosos caminhos pelos quais ele nos guia. Desse modo, diante do longo espelho ao pé da cama, herança de uma família tradicional, surgia o rosto angelical que foi a causa de tudo. As linhas de seus olhos estavam rígidas, e, pela primeira vez naquela noite, revelaram algo que não lembrava canduras silenciosas e necessidade de ouvir e fazer promessas de amor eterno. Espiou cada traço de seu rosto que maravilhou os olhos vidrados que jaziam inertes na cama. Não pôde deixar de liberar um sorriso irônico, rapidamente substituído por um muxoxo de inquietação. Recolheu suas roupas e desapareceu. O único rastro deixado foi a solidariedade sincera, afinal, ela era um anjo, para com a pessoa que seria responsável por limpar todo aquele sangue.

2 comentários:

Anônimo disse...

Belmonte?

Ha.

Leonardo disse...

maurinho... ninguém mais empina papagaios....